Pessoas Avarentas
Cap. 6:9-16 – Tendo falado dos falsos mestres cujo
ministério tem o efeito de estimular a avareza naqueles que estão sob seu
ensino, Paulo agora passa a falar da classe de pessoas que recebe a doutrina
deles. Ele designa esses como “os que querem ser ricos”. Eles são
pessoas avarentas que são atraídas pela linha carnal de ministério dos falsos
mestres.
V. 9 – Ao dizer “os que querem ser ricos”,
Paulo não está falando necessariamente de pessoas ricas, mas daqueles que tem o
“desejo” (JND) de ser ricos. O mal
que ele está condenando é o de estabelecer para si mesmo o objetivo de ser
rico. Uma pessoa pobre pode ter esse mau desejo, assim como uma pessoa rica. Isso
leva Paulo a fazer um solene discurso a Timóteo sobre o uso e o abuso das
riquezas, que continua por todo resto do capítulo. Ele dá algumas palavras de
exortação bastante necessárias para aqueles que vivem nessa desenvolvida civilização
ocidental onde a prosperidade tem quase matado o Cristianismo.
Ele diz a Timóteo que aqueles que perseguem as
riquezas como um objetivo, “caem em tentação, e em laço, e em muitas
concupiscências loucas e nocivas, que submergem os homens na perdição e ruína”.
Isso não significa que Cristãos que cobiçam riquezas perderão sua salvação, mas
que o pecado de perseguir as riquezas é tão perigoso e cegante que impede
homens em seus pecados de irem a Cristo. Saber que esse pecado tem tamanho
poder sobre a alma de uma pessoa deveria alarmar qualquer Cristão sensato, e
fazê-lo julgar e abandonar qualquer ideia de cobiçar riquezas.
V. 10 – Paulo prossegue com seu alerta, dizendo, “Porque
o amor ao dinheiro é a raiz de toda a espécie de males; e nessa cobiça alguns
se desviaram da fé [têm vagueado
da fé – JND], e se traspassaram a si mesmos com muitas dores”. As pessoas
geralmente citam esse verso de maneira errada, dizendo que “dinheiro é a raiz
de todos os males”. Mas isso não é o que ele diz; é o amor ao dinheiro que é a raiz de todos os males. As riquezas em si
não são condenadas; antes, é o “amor” pelas riquezas e o “querer”
(ter o desejo de) tê-las que é. Seu argumento é que se um homem ama desesperadamente
o dinheiro, ele expõe a si mesmo a todo tipo de males que lutam contra sua
alma. Aqueles que vão atrás de riquezas, com um mal desejo, pensam que
conseguirão alegria e felicidade, mas isso produz apenas sofrimento. Eles
buscam muitas riquezas, mas o que conseguem é “muitas dores”. Estejamos
avisados; e lembremo-nos de que o amor ao dinheiro nem sempre começa com tendo
milhões; pode começar com amor a cinco ou dez centavos! Paulo não está louvando
a pobreza; ele está advertindo contra a avareza.
Vs. 11-12 – Tendo em conta o aumento dos ensinos
errados e do desvio rumo ao lucro material entre muitos na casa de Deus, Paulo
exorta Timóteo a fazer quatro coisas:
ele devia “fugir” da avareza, “seguir” as características morais
do reino em sua vida pessoal, e “militar [combater – ARA]” o bom combate
da fé. Por último, mas não menos importante, ele devia “tomar posse da vida
eterna”. Ao fazer essas coisas, Timóteo estaria em uma condição adequada
para testemunhar uma “boa confissão” diante de todos.
Há uma ordem moral para essas coisas. Conforme o avanço
do declínio no testemunho Cristão (cap. 4:1), haveria uma oposição crescente à
revelação Cristã da verdade, como Paulo havia ensinado. Havia, portanto, uma
grande necessidade de um homem como Timóteo estar engajado no “combate da fé”
(conforme nota de rodapé da tradução de J. N. Darby em 1 Tm 6:12), que é
defender toda a verdade de Deus. No entanto, Timóteo não teria nenhum poder
nesse “bom conflito” se ele primeiro não fugisse do mal e seguisse o
bem.
Ao fazer seu apelo a
Timóteo, Paulo dá a ele um elogio muito alto ao chamá-lo de “homem de Deus”.
Esse termo só aparece nas Escrituras quando a massa do povo professo de Deus
falha em sua responsabilidade coletiva. Significa um homem que permanece fiel a
Deus e age por Ele quando aqueles que professam conhecer a Deus demonstram ser
infiéis. O termo sempre é usado no singular,
significando que fidelidade é algo estritamente individual. Na primeira
epístola, Paulo aplica o termo a Timóteo, mas na segunda epístola, ele o aplica
a todos que caminhariam fielmente em um dia mal (2 Tm 3:16-17).
Como mencionado anteriormente, Timóteo precisava
primeiro “fugir” da busca pelas riquezas. Ele não tinha que fugir do
dinheiro, mas da avidez de tê-lo. “Tentação, e laço” que vêm com tal
busca maligna tem desencaminhado muitos que de outra forma poderiam ter sido
úteis no serviço do Senhor. O próprio Senhor advertiu “Não podeis servir a
Deus e a mamom” (Lc 16:13). Mamom era o deus cananeu da fartura e da
prosperidade. Esse deus permanece como um símbolo da avidez pela fartura
material e riquezas. Se Timóteo tivesse qualquer anseio por “essas coisas”
ele não seria eficiente nesse conflito espiritual.
Não era o suficiente
para Timóteo evitar o mal; ele também devia “seguir [perseguir – JND] a justiça, a
piedade, a fé, o amor, a paciência [perseverança – JND], a mansidão”.
Essas características morais do reino de Deus deviam estar nele como uma
demonstração viva da verdade (Rm 14:17). Essas qualidades necessárias em um
homem de Deus não se tornam parte de uma pessoa por acidente; elas devem ser
buscadas. Isso requer um exercício de alma e propósito de coração para adquirir
tais qualidades.
Fazendo essas coisas, Timóteo adquiriria a força moral
e a coragem para “combater (diligentemente
– JND)” o “bom combate da fé”. – que consiste em “batalhardes,
diligentemente, pela fé que uma vez por todas foi entregue aos santos” (Jd
3 – ARA). O fato de isso ser chamado um “combate” e uma “batalha”
mostra que há uma verdadeira batalha em andamento para anular a verdade. Há
muitos artifícios mobilizados contra o testemunho Cristão, assim como há muitos
adversários (1 Co 16:9; 2 Co 2:11).
É dito à Timóteo: “milites” a “boa milícia” (cap. 1:18),
mas não entrando em discussões carnais sobre a verdade. Ele devia apresentar a
verdade da posição de alguém que está desfrutando atualmente dela. Por isso,
Paulo acrescenta uma quarta coisa – a necessidade de “tomar posse da vida
eterna”. O que isso significa? A vida eterna é nossa a partir do momento em
que cremos no evangelho (Jo 3:15, etc.), ainda assim, somos exortados a “tomar
posse” dela em termos práticos. Cada Cristão possui vida eterna como um dom
de Deus (Rm 6:23), mas tomar posse dessa vida na prática é uma outra questão. A
essência da vida eterna é ter comunhão consciente com o Pai e o Filho (Jo 17:3;
1 Jo 1:3) no poder do Espírito Santo de Deus habitando em nós (João 4:14). Portanto,
tomar posse dessa vida é viver no prazer da comunhão com o Pai e o Filho. Aqui
reside o segredo do poder para testemunhar “a boa confissão”.
Cristãos avarentos estão lutando para obter riqueza,
mas o Cristão fiel está em uma luta para defender a verdade. As consequências
dessas buscas diferentes são opostas; os Cristãos avarentos “se desviam da
fé” (v. 10), mas os Cristãos fiéis permanecem firmes no “combate da
fé” (v. 12 – ARA).
V. 13 – Ao testemunhar a boa confissão, certamente
iremos encontrar oposição. Paulo não minimiza isso. Perseguição viria (2 Tm
3:12), mas ele lembrou a Timóteo de que ele vivia sob o olhar do “Deus que
preserva a vida de todas as coisas”
(ARA). Isso foi mencionado para fortalecer a confiança de Timóteo no
Senhor, a fim de que ele permanecesse em seu testemunho pela verdade
destemidamente. Para encorajá-lo ainda mais, Paulo coloca o Senhor Jesus diante
dele como o Exemplo perfeito de fidelidade.
É apropriado que essa epístola – que tem a ver com
aqueles que compõem a casa de Deus manifestando corretamente o caráter de Deus
– deva terminar com a manifestação suprema na Pessoa de Cristo. Quando Ele
esteve aqui na Terra, Ele foi o grande Confessor da verdade e Representante
perfeito de Deus. Ele “diante de Pôncio Pilatos deu o testemunho de boa
confissão” ao manifestar perfeitamente Deus diante de enorme oposição. Ele
não comprometeria nada diante de Pilatos, mas esteve inabalável em Sua
confissão, ainda que Suas palavras fossem poucas.
V. 14 – Paulo não diz que a boa confissão de nosso
Senhor culminou com Ele sendo martirizado por homens perversos – que era algo
que realmente poderia acontecer a Timóteo. Em vez disso, direciona-o à “Aparição
de nosso Senhor Jesus Cristo”. Para encorajar a Timóteo ainda mais nessa
posição pela verdade, Paulo lembra a ele de que a fidelidade terá sua
recompensa no dia futuro. Se o mandamento (encargo) fosse mantido “sem
mácula e irrepreensão” seria recompensado, e manifestado na Aparição de
Cristo. Embora todo testemunho possa parecer ser inútil em virtude da
incredulidade do homem, na Aparição as consequências de tal fidelidade serão manifestadas
diante de todos.
Vs. 15-16 – Em conexão com o fato de que nossa
confissão atual será recompensada no dia vindouro, Paulo chama atenção para a
grande recompensa que Cristo irá receber no momento de Sua Aparição. “A seu tempo”
(na Aparição), o “bendito e único Soberano” (Deus) (ARA) “mostrará”
a todos “o Rei dos reis e Senhor dos senhores” (Cristo). (É difícil
discernir se os pronomes nesses versos estão se referindo a Deus o Pai ou ao
Senhor Jesus Cristo, mas aquilo que afirmamos parece ser o sentido geralmente
aceito dessa passagem.)
O assunto nessa passagem é esse: visto que o Senhor Jesus
manifestou a Deus fielmente em Seu primeiro advento, Deus O manifestará em Seu
segundo advento. Será uma manifestação gloriosa, mas não de Cristo em Sua
deidade essencial, pois isso está além do conhecimento da criatura e Ele subsiste
em luz inacessível. Em Seu Ser essencial, Deus tem “Ele só” “a
imortalidade, e habita na luz inacessível [inaproximável – JND]; a Quem nenhum dos homens viu nem pode
ver [nem é capaz de ver – JND]”. Deus na essência
abstrata de Seu Ser não será visto
naquele dia, mas Cristo como um Homem glorificado será o centro de toda glória
visível. J. N. Darby disse: “É Deus na abstração de Sua essência, na própria
imutabilidade de Seu Ser, nas prerrogativas de Sua majestade, encoberto a todos
os homens”.
Após falar da grandeza de Deus e glória de Cristo,
Paulo não pôde deixar de acrescentar uma pequena doxologia de louvor – “ao Qual
seja honra e poder sempiterno. Amém”.