Conservando a Fé e a Boa Consciência
V. 19 – Mas havia algo mais; se Timóteo ia guiar os
santos em uma linha de conduta adequada para a casa de Deus, ele precisava
prestar atenção à condição de sua própria alma “conservando a fé e a boa
consciência”. O estado moral que Timóteo tinha que trabalhar junto aos santos
também deveria ser encontrado nele próprio. Talvez o motivo pelo qual Paulo não
menciona “caridade [amor]” aqui, como ele faz no verso 5, é porque era
óbvio que Timóteo amava e cuidava dos santos profundamente (Fp 2:20).
Em primeiro lugar, Timóteo precisava estar “conservando
a fé”. Essa é uma referência à energia interna de confiança da alma em Deus
– a fé pessoal de Timóteo. Ela precisava ser mantida radiante e simples, não
para que ele pudesse preservar a salvação de sua alma – que estava eternamente
assegurada – mas para se proteger contra as dúvidas que o inimigo colocaria em
seu coração e que perturbaria sua confiança em Deus. Não deveria ser uma surpresa
para nós que Satanás esteja tentando destruir a fé do Cristão – especialmente
daqueles que estão empenhados no serviço ao Senhor. Ele usa frequentemente
circunstâncias difíceis da vida para gerar dúvidas em nosso coração sobre se
Deus realmente Se importa conosco e se está provendo para nós. Quando surgirem
dúvidas como essa – e elas certamente surgirão – nós precisaremos erguer “o
escudo da fé” e “apagar” esses “dardos inflamados” (Ef 6:16)
lembrando que “todas as coisas contribuem juntamente para o bem daqueles que
amam a Deus” (Rm 8:28). O primeiro sinal de que a fé de uma pessoa está
balançando sob a pressão do inimigo é que ela se torna desanimada no caminho;
que possamos estar vigilantes (1 Pe 5:8).
Em segundo lugar, Timóteo precisava conservar “uma boa
consciência”. Isso não é mantido por meio de nunca pecarmos, o que seria impossível,
porque “todos tropeçamos”, às vezes, de uma forma ou de outra (Tg 3:2). Uma
boa consciência é conservada ao julgarmos a nós mesmos regularmente. Julgamento
próprio diário, mesmo nas menores coisas, é essencial para ser guardado de
ficar à deriva em direção às rochas e sofrer um naufrágio espiritual. É a
confissão de pecado simples e sincera, combinada com o verdadeiro
arrependimento, que leva a alma de volta à comunhão com Deus (1 Jo 1:9). Resolver
rapidamente com Deus (não esperando um momento mais conveniente para confessar
um pecado a Ele) é um exercício necessário para manter uma condição correta de
alma.
Uma “boa” consciência é diferente de uma
consciência “purificada” (Hb 9:9, 14, 10:1-2, 12-14). A primeira diz
respeito a nossa condição e a segunda
a nossa posição diante de Deus. Quando
uma pessoa entende a obra consumada de Cristo e descansa com fé nisso, o
Espírito de Deus vem habitar na pessoa e lhe dá uma consciência purificada em
relação à pena eterna dos seus pecados. Mas um crente com uma consciência
purificada pode perder a boa consciência ao permitir o pecado em sua vida. Ele
não perde sua salvação, mas sua comunhão será interrompida, e assim, confissão
e arrependimento serão necessários para recuperá-la.
Quando uma pessoa rejeita uma boa consciência ao
recusar julgar a si mesma, como Paulo diz que alguns estavam fazendo, ela
sofrerá um “naufrágio quanto a fé” (Trad. de W. Kelly). J. N. Darby
observa que o segundo uso da palavra “fé” no verso 19, se refere à
doutrina do Cristianismo – a revelação da verdade que uma vez foi entregue aos
santos (Jd 3). Em geral, quando o artigo “a” está no texto antes da
palavra “fé”, o termo está se referindo à revelação Cristã da verdade. Quando
o artigo não está presente, refere-se à segurança e confiança pessoal em Deus. Portanto,
sofrer um naufrágio no que se refere à “fé” significa que uma pessoa se
desviou do trajeto acerca da verdade. Pode ser algo pequeno no início, mas com
o passar do tempo, o ângulo do desvio se torna mais evidente. A verdade não naufraga;
é aquilo que a pessoa sustenta quanto à doutrina que se torna deficiente. Visto
que más doutrinas raramente andam sozinhas, sua teologia reunirá um número cada
vez maior de elementos errados com o passar do tempo.
Para um Cristão, pecar é algo muito sério, mas o que é
pior é a relutância em julgar tal ato. É isso que leva uma pessoa a ir por um
caminho que leva ao naufrágio. Começa-se permitindo que algum pecado, ainda que
pequeno, permaneça sem ser julgado. Como consequência, ele perde uma boa
consciência e torna-se inquieto por estar sendo constantemente atormentado por
isso. Quase sempre, ele irá alterar sua doutrina para acomodar e justificar seu
trajeto – mas isso será para sua própria destruição espiritual, na medida em
que seu testemunho pessoal em relação à verdade está em questão.
V. 20 – Dois homens (“Himeneu e Alexandre”) são
mencionados como um exemplo de crentes que sofreram um naufrágio no seu
testemunho Cristão. Eles servem como um alerta a todos que não são cuidadosos
em conservar “fé e boa consciência”. Esses homens vieram sob o
julgamento do apóstolo e foram por ele “entregues a Satanás, para que
aprendam [sejam ensinados por
disciplina – JND] a não blasfemar”. Eles se desviaram de tal
maneira do trajeto que chegaram a ter a audácia de ensinar coisas depreciativas
sobre as Pessoas da Divindade – que é o que significa blasfêmia. Eles foram
postos fora da comunhão (excomungados) pelo apóstolo e deixados no mundo
exterior onde Satanás poderia lidar com eles.
Nós também vemos nisso que há um aspecto de salvação
prática do inimigo de nossas almas ao estarmos dentro da assembleia. Esses
homens foram postos fora dela, e assim perderam sua proteção. J. N. Darby
disse, “Na assembleia (quando está em sua condição normal) Satanás não tem esse
tipo de poder. Ela está guardada dele, por ser o lugar de habitação do Espírito
Santo, e protegida por Deus e pelo poder de Cristo. Satanás pode nos tentar
individualmente, mas ele não tem nenhum poder sobre as pessoas enquanto membros
da assembleia. Eles estão dentro, e, por mais fracos que possam estar,
Satanás não pode entrar nela. Eles podem ser entregues a ele para o seu próprio
bem. Isso pode acontecer a qualquer momento. Dentro da assembleia está o
Espírito Santo; Deus habita nela como Sua casa por meio do Espírito. Do lado de
fora está o mundo do qual Satanás é o príncipe. O apóstolo (pelo poder
conferido a ele, pois trata-se de um ato de poder positivo) entregou esses dois
homens ao poder do inimigo – privando-os da proteção que eles desfrutavam)” (Synopsis
of the Books of the Bible - JND,
sobre o capítulo 1:21).
Se pudermos tirar algo do significado dos nomes desses
dois homens como uma indicação de seu caráter, nós teríamos um aviso sério. “Himeneu”
significa “música de casamento”. Isso indica que ele tinha um aspecto
adorável no seu jeito de ser. Embora todos nós devamos buscar ser semelhantes a
Cristo em nosso caráter, se isso não for genuíno, pode ser enganoso. Há um
perigo de se tornar fascinado por pessoas que falam de um jeito amável e que
têm um bom comportamento. Nós podemos ser pegos desprevenidos por isso. Talvez
esse homem possa se apresentar muito bem, mas ele sustenta doutrinas blasfemas!
Devemos ficar atentos com esse tipo de pessoa. “Alexandre” (É
provavelmente a mesma pessoa mencionada em 2 Timóteo 4:14-15) significa “defensor
do homem”. Esse homem estava em oposição direta ao ministério de
Paulo, que não dá nenhum lugar ao primeiro homem nas coisas de Deus. Seu nome
sugere que ele resistiu e se opôs a essa linha de verdade e procurou dar um
lugar ao homem na carne na Igreja de Deus.
Em resumo, Paulo enfatizou duas coisas que são
essenciais para manter uma boa condição de alma no serviço ao Senhor:
- “Fé” que traz Deus para dentro.
- “Uma boa consciência” que julga a si mesmo e afasta o pecado.
Sem essas duas coisas, Timóteo não seria capaz de combater “o bom combate” (ARA).
Ele seria incapaz de permanecer diante do inimigo no combate da fé – tão pouco nós
também.
Assim, o “encargo” que Paulo deu a Timóteo não
era a de sair e fazer uma exibição de milagres, ou fazer algo que chamasse a
atenção para si mesmo; era apenas a de guiar os santos em uma linha de conduta
condizente com a ordem da casa de Deus. Isso era para ser realizado ensinando
as doutrinas da graça que promovem a atual dispensação de Deus no Cristianismo,
a fim de que os santos sejam encontrados em uma condição adequada para andarem
de acordo com a devida ordem na casa de Deus. Timóteo, então, tinha que
apresentar o padrão na casa para que eles seguissem; isso é ensinado nos capítulos
seguintes da epístola.
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